BRANGUS na visão de Antoninho Bastos

Com experiência, amor e muito trabalho, Antonio Martins Bastos Filho construiu uma vida dedicada ao campo. Ele é o titular da Cabanha São Bibiano de Uruguaiana/RS, sendo um dos grandes personagens da história do Brangus no Brasil. Muito respeitado entre os pecuaristas, “Antoninho”, como é carinhosamente chamado por todos, é formado em Medicina Veterinária pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e é uma das maiores referências em Brangus em nosso país, graças a sua destacada trajetória ao lado da raça. Já foi presidente do conselho técnico da Associação Brasileira de Brangus, participando inclusive das transições da sede do Rio Grande do Sul para o centro do país. Entusiasmado com o bom momento vivido pela raça, nesta entrevista publicada na edição Nº4 do Jornal Brangus Repórter, ele nos conta um pouco da história de sua consagrada seleção e revela suas opiniões sobre o a raça forte em nosso país. 


Brangus Repórter: Conte-nos um pouco de sua história e como começou o seu envolvimento com a pecuária e com a raça Brangus.

Antônio Martins Bastos Filho (Antoninho): Sou descendente de uma família radicada na região de Uruguaiana desde o fim do século passado. As duas bases familiares praticavam as atividades do campo, tanto da família de meu pai (Bastos) como de minha mãe (Benício). O meu pai iniciou a história da Cabanha São Bibiano em 1926 e foi um dos pioneiros na criação de animais puros registrados na região, com a finalidade de produzir reprodutores. Em 1943 ele iniciou a seleção da raça Angus. Quando me formei em 1962, meu pai veio a falecer e eu então, assumi a cabanha. Foi aí que iniciou meu interesse pelo Brangus, observando que era uma raça que teria boas condições de adaptação ao nosso meio, especialmente pela heterose obtida em sua formação, resultando em animais capazes de sobreviver bem em climas mais adversos e em pastagens de menor qualidade. Em 1970, iniciei a formação do plantel Brangus da Cabanha São Bibiano.


Brangus Repórter: E como foi essa formação do rebanho Brangus?
Antoninho: A partir da utilização de uma parcela de matrizes Angus para a realização do cruzamento com touros zebu. Também adquiri ventres 38 oriundos do berço da raça, que é a Fazenda Cinco Cruzes de Bagé, ou seja, estas duas fontes constituíram a nossa base desde 1970. De lá até hoje, me envolvi cada vez mais com a raça, inclusive fazendo parte das diretorias da associação, da mudança da sede da ABB do Rio Grande do Sul para o Brasil central e também como membro e presidente do conselho técnico, sempre buscando contribuir da maneira possível com o desenvolvimento da raça em nível nacional.


Brangus Repórter: Como você define a raça e o seu papel na pecuária brasileira?

Antoninho: Desde o princípio sempre tive a convicção de que o Brangus teria um grande futuro no Brasil, especialmente em termos de Brasil central. Nós já temos um gado zebuíno adaptado às condições brasileiras de produção, mas sabemos das deficiências deste grupo no sentido da qualidade de carne. Já o Angus possui limitações quanto à eficiência em função de clima. É aí que surge o Brangus, que me parece ser o instrumento mais eficiente hoje em levar a qualidade de carne necessária ao Brasil central, permanecendo também aqui na região sul, onde já está muito bem adaptado. Ao observar todos esses anos em que venho trabalhando com o Brangus, percebo que a raça sofreu uma grande transformação positiva em termos de conformação frigorífica. No início, era um gado mais deficiente nos aspectos de estrutura e de conformação carniceira, apesar de já se mostrar desde o princípio, uma raça rústica e resistente. Nesses anos de seleção, especialmente nas duas últimas décadas, nós conseguimos aprimorar esta questão através do melhoramento genético. Hoje o Brangus é um animal extremamente eficiente em termos de ganho de peso e de qualidade de carne. O Brangus é um instrumento muito eficiente e rústico para o nosso país. Eu julgo que seja uma raça rentável ao produtor, pela adaptação ao meio e também pela eficiência reprodutiva, sendo interessante também para a indústria que recebe uma carcaça de grande qualidade.  Tenho a convicção do futuro da raça, pois o Brangus possui uma abrangência de atuação muito grande, não sendo limitado a somente ao sul do país.
 
Brangus RepórterNa Cabanha São Bibiano, quais são seus principais critérios de seleção? Em sua opinião, quais características constituem um animal superior?

Antoninho: Em minha opinião, o fatot mais importante de forma geral, é um biotipo adaptado ao meio. Acho que a raça tem que desenvolver eficientemente todas suas funcionalidades no seu meio de atuação. Aí que entra o primeiro critério: O tamanho. A raça tem que ter um tamanho adequado, para que os animais possam suportar a alimentação disponível naquele ambiente. Está provado através de nossas experiências, que o Brangus não pode ser muito grande e nem muito pequeno, ou seja, começa pelo tamanho mediano. Um animal médio, onde a vaca produza todo um ano um terneiro e que ela o crie bem e que posteriormente, esse terneiro se desenvolva satisfatoriamente, tendo uma boa precocidade de terminação, ou seja, estando pronto para o abate com idade inferior a 3 anos, com carcaça bem conformada. Outro critério é buscar tanto fêmeas quanto machos férteis. A fêmea tem que ser mais leve, mais feminina, com um aparelho reprodutor e sistema mamário eficientes. O macho também tem que ter características de masculinidade, fertilidade e com uma estrutura de esqueleto que suporte sua atividade de monta a campo, tendo bons aprumos para poder caminhar e suportar o serviço de cobrir as vacas e assim, desempenhando bem sua função. Os animais também devem ter boa conformação frigorífica, sendo revestidos de massas musculares bem conformadas, especialmente nas áreas onde se concentram os cortes mais valorizados que são os posteriores, com depósito de gordura precoce (marmoreio) e com bom acabamento na carcaça. Também temos que considerar as características raciais. Se nós objetivarmos uma criação que vai disponibilizar genética, temos antes de tudo, ter um gado típico da raça, com o menor desvio possível do padrão racial. A tipicidade racial está ligada com as características produtivas e por isso mesmo, que há necessidade de manter animais típicos, assim como observar as questões de prepúcio, pelagem, cabeça, etc. Acredito que estes sejam os critérios mais importantes em uma seleção.


Brangus Repórter: Você já atuou como jurado em várias exposições brasileiras e internacionais. Como estas experiências influenciaram sua visão de criador e conhecedor da raça?

Antoninho: Minha ação como jurado vem da minha ação de criador. Os anos de trabalho me deram a oportunidade de conhecer melhor a raça e por isso, já fui convidado para julgar muitas vezes. No Brangus já julguei várias exposições, tanto no Brasil quanto em outros países. Quando foi formado o circuito das exposições nacionais da raça em nosso país, fui o jurado das cinco primeiras edições, além de várias outras exposições no Rio Grande do Sul. Nos eventos internacionais, tive a oportunidade de julgar a nacional do Brangus na Argentina realizada em Resistência, no início dos anos 2000 e também na Exposição do Prado em Montevidéu. Também estive no Paraguai, julgando a exposição nacional daquele país, na qual posso considerar uma das exposições mais qualificadas da América do Sul no momento, onde havia mais de 200 animais. Nestes grandes eventos, o jurado deve ter a sensibilidade de captar qualidades e defeitos em animais dentro de um grupo próximo. No entanto, não existe animal algum igual ao outro, sempre haverá as diferenças. Com tranqüilidade, o juiz saberá avaliar os exemplares com precisão. Todas estas experiências me trouxeram um conhecimento maior e ao mesmo tempo proporcionaram a oportunidade de acompanhar o que está acontecendo no mundo. Eu como criador e como jurado, sempre busco informações visando ver o que se passa com a raça em outros lugares, pois sempre há coisas novas para observar. A genética sempre tem uma necessidade de renovação e novas incorporações genéticas serão sempre necessárias para promover o melhoramento.  

Brangus Repórter: Como você enxerga a importância das avaliações através das metodologias científicas para o melhoramento genético? É possível aliar a seleção visual com os programas de melhoramento?
Antoninho: 
Neste aspecto, existem dois pontos de vista. Como criador, todas as formas e instrumentos que existem nos programas de seleção genética são importantes para promover o crescimento do plantel e cada criador normalmente possui deficiências que precisam ser melhoradas. Os programas de melhoramento genético serão extremamente úteis para o selecionador buscar índices superiores para aprimorar as deficiências que ele tem. Já como jurado, é preciso ver uma uniformidade do tipo. Os índices podem ajudar o juiz a formar uma opinião sobre determinado animal, sendo que estes índices estarão já refletidos visualmente nas partes do exemplar. Portanto, as avaliações são importantes, mas não definitivas. Para o criador, os programas de melhoramento são muito úteis e necessários. Porém, a seleção visual verá a harmonia do conjunto. Se for preciso aprimorar tamanho, logicamente, será preciso buscar os índices de ganho de peso. Agora, se o jurado valorizar só o índice de ganho de peso, estará buscando em um julgamento morfológico, os animais maiores, que terão dados positivos para maior ganho de peso, ou seja, fugindo do critério que busca o ideal que é o animal mediano. Os índices oriundos dos programas de melhoramento genético são muito importantes para o aprimoramento, formação e correção de um plantel. Agora como jurado em uma exposição, o importante é buscar o equilíbrio visual entre todos estes índices, dentro de um animal ideal, ou seja, ele é útil, mas não decisivo. É possível e devem ser aliadas as duas formas, buscando sempre a harmonia e o equilíbrio, sendo ambas úteis em conjunto. Temos que entender que o touro de pista, “o melhorador” tem que ser equilibrado. Há uma verdade muito clara na questão de julgamento: O touro grande campeão necessariamente tem que ser o touro para todas as vacas e não para algumas vacas, sendo melhorador em qualquer situação, reunindo as características produtivas da forma mais equilibrada possível. Equilíbrio é a chave para o melhoramento, sendo imprescindível em ambas as formas possíveis de uma seleção.


Brangus Repórter: Em sua opinião como o Brangus pode ser mais inserido na cadeia produtiva da carne no Brasil?

Antoninho: O Brangus, sendo uma raça sintética com capacidade de adaptação em diferentes ambientes no Brasil, é a raça que mais pode contribuir no aspecto de melhoramento da qualidade da carne. O Brasil é o maior exportador de carne bovina e vai se manter nesta posição durante muitos e muitos anos, pois país nenhum vai produzir carne a pasto “mais barata” que o nosso. O que nos falta é preço, remuneração, valorização. Vendemos quantidade, mas não vendemos qualidade. O dia em que vendermos qualidade em quantidade, teremos uma pecuária de corte extremamente forte, vigorosa, rentável e muito mais competitiva. Como conseguir este objetivo: Melhorar a qualidade do produto. Qual a raça que tem condições para buscar este objetivo e que é abrangente em termos geográficos no Brasil? É o Brangus. Ele tem um espaço muito grande no cruzamento com zebuínos que vão produzir animais adaptados ao nosso meio, um gado mais eficiente, precoce e com alta qualidade de carne. Este é o futuro do Brasil. O Brangus é a grande solução, não tenho dúvidas disso.


Brangus Repórter: Você defende o uso de touros Brangus em cruzamento industrial em nível nacional, como uma ferramenta eficiente na obtenção de novilhos mais precoces e produtores de carne com maior valor agregado?

Antoninho: Os animais Brangus F1 (1/2 sangue Angus/Zebu) são extremamente férteis e eficientes. Neste caso, o uso dos touros Brangus nestas fêmeas permitirá conservar esta qualidade nas próximas gerações e agregar valor quando utilizado nas vacas zebuínas. É a raça que com eficiência reprodutiva vai propagar estas qualidades. Nós não temos a nível nacional, toda a possibilidade de inseminação. Não se pode pensar em produzir carne no Brasil somente via inseminação. A raça para ocupar esta lacuna de monta natural é o Brangus. Tem muito touro para ser produzido para atender esta necessidade e principalmente agora, com a retomada do cruzamento industrial o Brangus surge como grande alternativa, tanto na monta natural como também na venda de sêmen. É o grande momento do Brangus.

Brangus Repórter:
 Como você avalia o estágio zootécnico atual do Brangus Brasileiro? Quais os principais pontos que em sua opinião, devem ser melhorados na seleção como um todo?

Antoninho: Acho que o estágio atual do Brangus é muito promissor. Houve uma evolução muito grande desde o inicio da raça e da minha criação em 1970. A raça está nas mãos de criadores eficientes e numerosos e este número de novos selecionadores vem crescendo cada vez mais. Isto é um indicativo de que esses pecuaristas esclarecidos e de visão, vão manter o impulso da raça para um bom futuro, um futuro muito longo. Ao compararmos o nosso Brangus, com o Brangus argentino e o americano, eu diria que nós estamos em situação igual. Nós usamos a genética melhoradora Americana, a Argentina e a nossa. O que pode haver um pouco de diferença é em relação ao meio de criação e tanto a Argentina quanto os Estados Unidos possuem regiões com melhores condições de criação do que as nossas. No entanto, a consistência genética é a mesma, ou seja, se der condições o nosso Brangus, ele também mostrará o seu potencial da mesma forma. Eu diria que hoje estamos em um mesmo patamar aos demais países, porém com uma condição muito boa, que é o fato da raça estar nas mãos de criadores que possuem capacidade de evoluir.  O Brangus está novamente em um bom momento, é preciso permanecer desta forma, buscando animais de tamanho médio, com fertilidade, com conformação de carne adequada, com boa estrutura de esqueleto (compatíveis com aquela massa muscular que carregam) e a pureza racial, ou seja, quem quer criar Brangus tem que possuir animais Brangus, dentro dos padrões. Os Argentinos, por exemplo, já estão notando nosso bom trabalho com a raça e por isso, já estão buscando renovação em nosso país. O futuro é isto, o intercâmbio genético cada vez mais forte, incluindo neste contexto, o Paraguai que possui uma qualidade muito interessante e que também poderá ser útil para o aprimoramento da raça. Temos que olhar para o Brangus do Paraguai com bons olhos.

Brangus Repórter: Para concluir, quem é Antoninho Bastos longe do campo?
Antoninho: 
Eu não sei quem sou longe do campo. Nasci, me criei e me tornei um homem do campo e não consigo me encontrar fora dele. Apesar de morar na cidade, todo dia vou na cabanha, pois gosto do que faço e sempre me dediquei muito ao agronegócio.

Post: Imprensa e Comunicação
Associação Brasileira de Brangus
Nathã Carvalho

Anterior
Anterior

Exportações de carne surpreendem

Próximo
Próximo

Analisando o lançamento da carne Seara Angus